Pigafetta de Felicitas Hoppe: Viagem à Volta do Mundo na Pós-Modernidade
Palavras-chave:
Literatura alemã contemporânea, circum-navegação, metaficção historiográfica, intertextualidade, viagem e escritaResumo
Uma época de massificação do turismo, de mundo globalizado que não deixa margem para a diferença e de redes digitais que nos dão informação sobre o desconhecido sem que seja necessário abandonar o nosso espaço, uma tal época obriga a repensar não apenas o conceito de viagem, mas também o discurso sobre a viagem e a própria noção genológica de “literatura de viagens”. É o que faz a obra de Felicitas Hoppe, escritora alemã distinguida com o prestigiado Prémio Georg Büchner no ano de 2012. Desde o romance Pigafetta (1999) até à autobiografia fictícia Hoppe (2012), passando por histórias infantis como Die Reise nach Java (2004) ou pelos esboços biográficos Verbrecher und Versager (2004), o motivo da viagem está presente nos seus textos e muitas vezes em relação simbólica com o próprio processo de escrita. Com o romance Pigafetta, Felicitas Hoppe insere-se na tradição de autores que, à semelhança de Stefan Zweig, se deixaram cativar pelo tema magalânico da circum-navegação através do texto do cronista de bordo, o italiano António Pigafetta. Hoppe não faz, porém, como Zweig, uma reconstituição da aventura ou da figura de Magalhães. Antes surpreende o leitor com a ficcionalização de uma viagem à volta do mundo que ela própria levou a cabo num navio de contentores. Pela voz de uma narradora inominada, Hoppe expõe a história em articulação intertextual com o relato – e a figura – de Pigafetta, desenhando essa circum-navegação moderna numa dimensão flutuante de tempo e espaço, numa liquidez dinâmica de identidades e num discurso fluido de fantasia e virtuosismo literário. É esta súmula fractal e pós-moderna de Felicitas Hoppe sobre a viagem marítima como percepção de realidades interiores e exteriores moventes e como metáfora da narrativa contemporânea que pretendo apresentar.
